sexta-feira, 3 de agosto de 2012

Remanescentes forever (parte I)



Nós tínhamos uma banda. Quer dizer, quase. Era uma “banda platônica”, digamos assim. Nunca chegamos a nos apresentar. O ano era 2001 e eu, Raoni Martins e Diego Prado pensamos em criar a banda Remanescentes, uma mistura de Oasis com Zé Geraldo. Eu seria o vocalista, embora todos soubessem que o Raoni cantava bem melhor.

Não faz muito que li o livro Cruzando o Paraíso, de Sam Shepard. Foi inevitável, lembrei-me de uma de nossas melhores canções. A música que talvez eu mais me identifique. Que bom, Raoni, ter feito esta parceria. As canções que fizemos juntos (eu sempre nas letras pq vc e o Diego é que tocavam) traduzem muito bem o espírito daquela época meio adolescente.

Problemas demais

Eu cruzei o céu
Não sei como aconteceu
Quase um ano se passou por mim
Eu segui fiel à vida que inventei
Pra escapar dos sonhos ruins
Não anoiteceu
No dia em que parti
Confesso que foi bem melhor assim
Eu não quis lembrar
Do passado que ficou em mim
Porque eu estou bem
Entre tudo que ficou
Eu não quis lembrar
Do passado que ficou em mim
E agora eu já sei que eu já causei problemas demais

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Das coisas que também me interessam

 Me interessa o jeito que as pessoas falam. As prosódias e as sintaxes. A cara de medo de quem chega tarde. E a cara de pau de quem faz alarde. Me interessa o argumento do impostor. O discurso impecável do doutor. E a maneira falsa do original que nunca se desoriginaliza.

Me interessa o que as pessoas pensam, como agem, o que fazem. E também o que esquecem, o que deixam, o que não fazem.

Me interessam os palavrões da porra, caralho! A fronteira entre o explícito e o ato falho. A norma culta do advogado, e o som estranho quando você fala rindo.  O porte solene do padre. O perfil expansivo do pastor. Me interessa a frase toda e o subentendido.

Me interessa a algaravia. Charlanda, charangas, migué, kaô, lábia. As verborragias, as verves, as diarréias mentais. O silêncio dos gatos caçando pardais. Barulho de guitarra, bateria, metais.

Me interessa a palavra bruta que brande e bate. O balbucio que acaricia. O rimbambar de consoantes e vogais no megafone. A voz rouca da amante ao telefone. Até mesmo o tom rude dos generais.

Me interessam o assovio do picolezeiro e o apito do guarda noturno. A voz do preto, do branco, do índio. O código Morse, os dialetos, o espanhol argentino. Me interessa o sotaque goshmeinto do carioca. E o modo arrétado do nordestino. Me interessa palavras estranhas como aluvião, sucurujiba e onomástica. Me interessam as epístolas e as frases escritas em papéis de bala. A palavra amor e a palavra mala. O significado e o (in)significante. Eu, você, o hoje e o antes. Amanhã é depois, mais além, adiante.

Me interessa o sorriso, o escárnio e até o seu pouco caso. Na verdade, é impagável a sua cara de quem perdeu tempo lendo minhas baboseiras no feicibuqui.